O lixo americano definitivamente não é igual ao brasileiro. Para começar, os lixeiros não passam todos os dias; existem dias específicos da semana nos quais o lixo deve ser posto na rua para ser recolhido, e não é diariamente. Além disso, em geral os lixeiros não recolhem lixo dos dois lados da rua no mesmo dia; lados opostos da rua são recolhidos em dias diferentes, de forma que os lixeiros nunca precisam ficar atravessando a rua para pegar lixo do outro lado, aumentando a segurança, a eficiência e atrapalhando menos o tráfego.
Adicionalmente, mesmo sendo dia de coleta, não se pode jogar fora qualquer coisa que se queira nem em qualquer quantidade. Existe um dia específico para se jogar fora lixo reciclável, por exemplo. Aliás, essa questão de reciclagem é todo um subassunto; é responsabilidade de quem joga lixo fora já jogá-lo separado em categorias, e cada tipo de lixo tem que ser embalado num saco plástico de uma certa cor. Garrafas plásticas e latas vazias, por exemplo, devem ser descartadas em sacos azuis. Papel e papelão em sacos verdes. Lixo orgânico em sacos pretos. E assim por diante.
Agora, o mais surpreendente mesmo para mim foi a qualidade do lixo. Em dia de coleta, algumas horas antes dos lixeiros passarem, à medida em que as pessoas vão colocando o lixo para fora, normalmente ao anoitecer, as calçadas ficam cheias. Evidentemente, uma boa parte é do lixo comum ao qual estamos acostumados, mas só uma parte.
Uma outra parte considerável é composta de objetos que não estamos acostumados a ver no lixo. Mesas, cadeiras, estantes, colchões, fornos de microondas, ventiladores, aparelhos de ar-condicionado, televisões, monitores, aparelhos de som, computadores, caixas de som, bicicletas, geladeiras, fornos de microondas (particularmente freqüentes), tocadores de DVD, enfim – praticamente qualquer objeto que se encontraria numa residência. E não são ocorrências raras – são montes dessas coisas, todas as semanas. Mais do que isso, com altíssima freqüência, esses ítens não estão velhos nem quebrados. Só posso especular que tenham sido substituídos por uma versão ainda mais recente ou que o dono esteja se mudando e não tenha outro destino para parte de suas propriedades.
Seja qual for a explicação, o fenômeno é bastante real, e mais uma vez pode parecer que minha descrição seja exagerada. Para corroborar esse relato, saí à noite e dei uma volta pela vizinhança fotografando o lixo. São tantas fotos que postá-las todas aqui entulharia o site, então escolhi algumas, mas de fato todos os outros tipos de objeto listados acima também estavam representados, e múltiplas vezes. Eu poderia fazer algum tipo de análise sobre capitalismo, sociedade de consumo, desperdício, prosperidade, mobilidade social e outras idéias relacionadas, mas acho que os fatos em si mesmos já são bastante interessantes, e a verdade é que eu não sei muito bem que juízo fazer disso. Então fica aqui registrado que é facilmente possível mobiliar um apartamento em Nova York com algumas poucas excursões à calçada da sua rua.
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Um amigo meu ganhou um carro de um vizinho que ia trocar e não tinha onde guardar. Um Civic que ia pro lixo.
Já vi no lixo: bicicletas novas (2 de uma vez só), monitores (de até 20″), sofás, centenas de livros (de uma vez só), impressoras a laser, câmeras fotográficas, tapetes, televisores, CD/DVD players, antenas parabólicas, notas de dinheiro de outros países, obras de arte, e não pára por aí.
Falam tão mal dos americanos, dizendo que eles são materialistas e blá-blá-blá, mas a verdade é que, apesar de gostar de consumir, o americano em geral é desprendido. Quando tem de se mudar, ele não quer nem saber: larga um monte de coisa boa no lixo e vai embora.
Tem um site onde as pessoas tiram fotos dessas coisas legais no lixo e colocam a localização no Google Maps pra quem quiser ir pegar. Viva a tecnologia. Lá não existe muito isso de usados. Talvez, parte dessas coisas tenha saída para o Exército da Salvação, lá eu sei.
Lefebvre – ocasionalmente a prefeitura faz umas campanhas para que as pessoas levem o lixo de mais alta qualidade (como computadores que funcionem) para centros especiais que então cuidam de doá-los apropriadamente, mas em geral as pessoas simplesmente deixam na calçada, às vezes até mesmo (já vi em diversas ocasiões) com um bilhete anunciando “funcionando perfeitamente, pode levar” ou algo equivalente. Tenho na minha sala uma TV Sony de 28 (!) polegadas que eu simplesmente não agüentei e tive que levar pra casa para ver se funcionava. Funcionou perfeitamente. Tive que buscar o meu carrinho de bagagem para resgatá-la, porém, pois o bicho é enorme e pesa uma tonelada. :-)
Sergio, eu particularmente acho isso um absurdo. Ja recomendei a varios amigos que perguntaram o que fazer com coisas que nao queriam mais: liguem para o SALVATION ARMY. Eles marcam horario, vao com um caminhaozinho a sua casa e levam tudo, voce nao precisa levantar nem o dedo minimo, basta ligar. Ah, e ainda ganha uma declaracao de doacao que vale para descontar no Imposto de Renda. Eh muito show.
fotos de pessoas da população BRASILEIRA pegando lixo nas ruas