“Religion is based … mainly upon fear … fear of the mysterious, fear of defeat, fear of death. Fear is the parent of cruelty, and therefore it is no wonder if cruelty and religion have gone hand in hand … My own view on religion is that of Lucretius. I regard it as a disease born of fear and as a source of untold misery to the human race.”
-Bertrand Russell
Com o risco de chover no molhado e voltar a um tema requentado e excessivamente debulhado a ponto de ficar chato, voltemos ao tema do ateísmo. Ao escrever esse tipo de texto considero que estou (espero estar) prestando um serviço de utilidade pública ao me dar ao trabalho de explicar o que deveria ser abundantemente óbvio. Mas se não é óbvio para certas pessoas intelectualmente honestas e que buscam a verdade, então de fato é muito importante que alguém escreva sobre o assunto, nem que seja para dar apoio moral a quem olha para certas coisas e pensa “mas peraí, isso não faz nenhum sentido” e no entanto acaba por questionar o próprio julgamento diante da ausência de pensamento divergente e idéias discordantes no universo social no qual habita.
Enfim, a motivação desta vez é a seguinte. Volta e meia recebo mensagens de leitores afirmando que tal ou qual resposta a um de meus textos sobre ateísmo merece comentários, que apresenta argumentos sólidos, que desconstrói completamente o que eu falei e coisa e tal. Em geral eu já conheço as tais respostas, e não comentei nada porque são muito fraquinhas e não acrescentariam absolutamente nada ao debate. No entanto, como eu coloquei, talvez o que seja absolutamente óbvio para mim não o seja para alguns leitores, e existe uma pequena chance de que nem todos eles tenham se fechado hermeticamente a argumentos e a pensar criticamente sobre o assunto. Então, assim sendo, lá vai.
A primeira resposta que vou comentar está publicada aqui : Refutando um ateu
Essa resposta já começa muitíssimo mal ao anunciar que vai usar um fomato inspirado no disputatio medieval. Repito aqui o que já disse diversas vezes. Existe uma diferença brutal e grotesca entre reverenciar o intelecto de pessoas brilhantes do passado que foram capazes de ver muito adiante de seu tempo versus citá-las literalmente ou achar acriticamente que os métodos e idéias que eram revolucionariamente geniais há séculos atrás ainda o sejam pelos padrões de hoje.
Enfim, a resposta em questão se refere ao meu texto Ateísmo Para Principiantes.
A resposta começa por fazer a seguinte afirmação sobre o meu texto :
1) É possível fazer uma analogia entre Deus e o Papai Noel. São duas crenças, e de mesmo grau.
Já nesta primeira frase, a desonestidade (ou alternativamente a obtusidade) do autor fica clara. Absolutamente não afirmei isto colocado acima, e muito pelo contrário, escolhi Papai Noel ao invés de Zeus ou Horus como exemplo especificamente porque é razoavelmente incontroverso (exceto para quem é maluco ou não tem absolutamente nada melhor para fazer) que Papai Noel não exista de fato. Apesar disso, caso fosse contra a lei não acreditar em Papai Noel ou caso eu fosse regularmente atacado por questionar essa crença, discutir a existência de Papai Noel cresceria muito em relevância, e é esse tipo de reação e posição que caracteriza os ateus, não em geral um arcabouço filosófico maior em comum. Eu estou nesta parte do texto discutindo a falta de unidade ideológica entre ateus, não se a crença em deus é filosoficamente equivalente à crença em Papai Noel.
Mas então, ironicamente ao extremo, a resposta prossegue para afirmar :
NEGAÇÃO: O argüente constrói um “boneco de palha” do Deus cristão. O Deus cristão não é um mito, é o ser infinito e necessário. Não consta que Papai Noel seja um ser infinito, mas sim um ser contingente e ficcional.
Ora, santas ironias. Isso de dizer que eu estou construindo uma equivalência entre deus – e veja só, especificamente o deus cristão, que eu nem sequer menciono, afinal ateus não acreditam em NENHUM deus, não só no cristão – isso sim é um ridículo boneco de palha. Esta parte do meu texto nem sequer discute se deus existe ou não, e sim o fato de que crer ou não crer em deus não são posições sustentadas por grupos com perfis similares de unidade ideológica.
Segue-se então um amontoado de – não há como descrever de outra forma – baboseiras sobre “o ser infinito já foi demonstrado desde Parmênides” :
o Ser infinito já foi demonstrado desde Parmênides, e aqui demonstramos da nossa forma: ou há algo, ou não há nada. Se nada há, nada se questiona, logo algo há, algo é. A este algo, a esta positividade, a esta estabilidade, a metafísica chama de ser. Ou o ser é finito e contingente ou é infinito e necessário. Se é finito e contingente, houve um tempo em que nada houve. Mas do nada absoluto nada pode provir, porque nada não há, o nada não afirma nada, não tem positividade. Logo, o ser é infinito e necessário. Este ser infinito e necessário é o Deus cristão.
Este parágrafo é um amontoado de palavras em busca de um significado. Metade dos termos não têm qualquer significado minimamente rigoroso ou aplicável de qualquer forma útil, e saltos inacreditáveis são dados mesmo que aceitemos a “lógica” interna do “raciocínio”. Chegamos aqui num ponto em que, sinceramente, nem adianta explicar. Isso aí acima é um monte de besteiras. São coisas como esta que fizeram a metafísica perder sua credibilidade. Não que eu pessoalmente ache que ela não tenha importância ou lugar na filosofia ou mesmo na ciência moderna, mas isso aí é só uma chutação total sem qualquer rigor.
Vou me concentrar portanto em uma parte do argumento que é a menos delirante, embora ainda respondida de forma equivocada, que é : Como resolver o legítimo e profundo problema metafísico de que existe qualquer coisa? Por que existe algo ou invés de nada? Esse é o problema que de fato precede todos os outros e que está na base de grande parte das tentativas de construir uma teologia que parta de (ou pelo menos respeite) lógica e razão. Só que dessa questão não resolvida, vezes demais se parte então para postular alguma “causa primeira” com todo tipo de propriedades arbitrárias e que magicamente não requer ela mesma uma explicação, geralmente com pseudo-justificativas do tipo “ela sempre existiu”. Ora, se é para postular que algo sempre existiu e que por isso não precisaria de explicação (que já é evidentemente uma enrolação, mas aceitando esse argumento) então nesse caso vamos postular que o universo sempre existiu, ou que as leis da física sempre existiram, e que as leis físicas são logicamente necessárias do jeito que são, embora ainda não tenhamos entendido o motivo. Isso é muito mais metafisicamente satisfatório do que criar entidades com propriedades fantásticas que não temos nem remotamente condições de determinar ou justificar.
Enfim, a resposta parte então para as seguintes afirmações sobre o trecho seguinte do meu texto :
Proposições contidas
1) Religiosos em geral não duvidam de suas posições, acreditam estar certos.
2) Ateus, pelo contrário, são céticos sobre quase tudo. A única certeza deles é a de que Deus não existe.
3) É incontornável o fato de que alguém está certo e alguém está errado.
Mais uma vez, essas afirmações só podem ser explicadas por desonestidade ou obtusidade. Em primeiro lugar, a afirmação (1) não foi originalmente feita por mim, e sim precisamente pelo texto que estou criticando. Mas isso colocado, eu de fato acho que muitos religiosos parecem – não raro anunciam abertamente – assumir uma posição perfeitamente acrítica e dogmática diante de suas crenças. Mas seja como for, e seja quão críticos e ponderados alguns religiosos sejam antes de chegarem às suas conclusões, grande parte deles – e isso depende em parte da religião específica – de fato aceita argumentos baseados em autoridade, tradição ou revelação como perfeitamente válidos.
Então eu cuidadosamente passei a descrever que isso distingue a mim, eu, pessoalmente, do religioso padrão. Note-se, eu *não* acho, nem defendi, que a minha posição pessoal seja representativa de todos os ateus ou mesmo dos ateus em geral. Mutíssimo pelo contrário; eu repetidamente argumento que não existe posição filosófica ou ideológica unificada entre os ateus, e que essencialmente a única coisa que os *une* numa categoria – absolutamente não a única coisa em que acreditam – é não acreditarem em deus. Então descrever o que eu disse como sendo o enunciado em (2) é uma falsificação total; não só não é o que eu disse como é oposto ao que eu disse em vários aspectos. Se o autor realmente depreendeu honestamente algo como o que está em (2) do meu texto isso é algo que beira o analfabetismo funcional e é risível (ou conversamente altamente apropriado) que vá querer então construir um debate escolástico (entre si mesmo e um exército de bonecos de palha). No texto original, eu sublinho veementemente a questão de que nem todos os ateus rejeitam a idéia de deus pelos mesmos motivos, e que variam enormemente em suas crenças e ideologias. Esse é um dos principais temas do texto inteiro. Eu não acho nem afirmei que a maior parte dos ateus seja “cetico sobre quase tudo”, e aliás nem que *eu mesmo* seja cético sobre quase tudo – o que eu afirmei foi o que o tipo de argumento que eu aceito como legítimo exclui vários dos tipos de argumento que o religioso médio aceita como legítimo. Mas eu de fato aceito muitos argumentos concretos como legítimos e em muitos fatos como solidamente estabelecidos (o que não quer dizer que não possam ser legitimamente questionados, apenas que é preciso que sejam apresentados contra-argumentos de força suficiente). Apenas não aceito que crença em fatos deva ser decidida com base em tradição, revelação ou autoridade, como ostensivamente grande parte dos religiosos abertamente faz.
Em resumo, é simplesmente ridícula a afirmação de que eu teria dito, seja sobre “os ateus”, seja sobre mim mesmo, que “a única certeza deles é de que deus não existe”. Isso não tem absolutamente nada a ver com qualquer coisa que eu tenha dito. Muitos ateus inclusive são ridiculamente pouco críticos, e divergem dos religiosos apenas por acreditarem em autoridades (ou fantasias) diferentes. O autor da resposta segue porém não só partindo dessas premissas absolutamente absurdas sobre o que eu teria dito como procede mais uma vez a construir argumentos tão completamente delirantes que não há nem o que comentar. Eu posso me munir de paciência e me aventurar a refutar afirmaçoes como “o Sol gira em torno da Terra”, que estão completamente erradas, mas que pelo menos fazem sentido e nas quais há concebivelmente motivos para acreditar. Mas não há paciência que se justifique para afirmações do tipo “já que o Sol gira em torno da Terra seu magnetismo animal aquece a aura da atmosfera terreste e provoca permutações astrais”. É esse o nível do discurso com o qual nos defrontamos aqui. Não existe sequer o que refutar. São Tomás de Aquino provavelmente teria vergonha de se ver citado num contexto como esse, e *certamente* retiraria grandes partes das coisas que escreveu se pudesse ter acesso à lógica, à filosofia e a ciencia modernas. Argumentar no século 21 com base nas categorias metafísicas e na estrutura lógica que prevaleciam na escolástica medieval é RIDÍCULO.
Sobre a proposição (3), eu *de fato* a coloco – é incontornável o fato de que alguém está certo e alguém está errado. E tanto quanto é possível decodificar do festival de confusão mental no trecho da resposta que se segue, o autor afirma exatamente o mesmo que eu, embora por vias altamente tortuosas – que é inescapável que exista uma verdade necessária, e que se discordamos sobre características irrenconciliáveis da sua natureza última, um dos dois lados está inescapavalmente errado. Agora, repetidamente dizer “e essa verdade necessária é o deus cristão” é simplesmente patético, dado que “o deus cristão” envolve um grande conjunto de características que de forma alguma decorrem automaticamente do simples princípio metafísico de que é preciso haver no fundamento de tudo uma verdade necessária. Essa “verdade necessária” poderia envolver um deus, três deuses, infinitos deuses, ou zero deuses. Minha posição pessoal é que tudo indica que envolva zero deuses, não que eu negue o princípio metafísico de que a verdade, em algum nível de abstração, é necessária.
Do mesmo trecho do meu texto são “extraídas” as seguintes proposições :
4) Ateus em geral fundamentam seus argumentos; religiosos em geral não.
5) Religiosos em geral aceitam argumentos de autoridade, tradição e revelação, enquanto um ateu os rechaça.
6) A fé não é uma boa base para um sistema de crenças.
Novamente, o autor da reposta confunde completamente em (4) o que eu afirmo sobre *mim* como sendo algo que eu estaria afirmando sobre todos os ateus, algo que eu digo com todas as palavras que não é o caso. Mas mesmo tomando como descrição do que teria dito sobre mim, é completamente absurda. Eu não disse que os religiosos não fundamentam seus argumentos, apenas que quase a totalidade deles aceita como argumentos válidos categorias de argumentos que eu absolutamente não aceito como tal.
E sim, a primeira parte de (5) é não só ontensivamente e admitidamente verdadeira como em grande parte das religiões, uma exigência formal. Quando a isso ser diferente para os ateus em geral, mais uma vez – eu *não* acho que todos os ateus pensem igual a mim, e isso é um dos principais pontos do meu texto. Inúmeros ateus estão perfeitamente felizes em aceitar autoridade, tradição ou mesmo revelação, apenas divergem dos religiosos sobre quais autoridades, tradições ou revelações consideram legítimas.
Sobre (6), o único ponto sobre o qual o autor realmente diz algo novo, finalmente – embora mais uma vez de forma convoluta – se coloca algo que parece com um argumento que vale a pena considerar, que é o seguinte : a fé é um elemento indispensável em qualquer sistema de crenças. Esta não é uma afirmação absurda, mas sobre ela eu tenho duas observações.
A primeira observação é que apesar de não ser absurda, ela é falsa. É perfeitamente possível produzir todos tipo de afirmações cuja verdade é logicamente necessária sem que isso envolva qualquer tipo de fé. É perfeitamente possível ter crenças que não dependam de qualquer suposição arbitrária. Certo, é verdade que derivações lógicas partem de conjuntos de axiomas. Porém não há nada de errado com o conjunto vazio como ponto de partida, e é simplesmente errado concluir que dele nada podemos derivar. É verdade que deste ponto de partida somente poderemos construir teorias tautologicamente equivalentes ao conjunto vazio, mas se vamos argumentar que nosso universo está fundamentado em última análise em verdades logicamente necessárias, nosso objetivo último deveria ser precisamente explicar como é possível derivar o universo inteiro do conjunto vazio – um projeto altamente ambicioso que talvez nunca seja possível realizar completamente. Mas não, a fé não é necessária para “qualquer” sistema de crenças.
A segunda observação é que mesmo que aceitemos que nem todo sistema de crenças requeira fé, algúem poderia observar que quando lidando com conhecimento incompleto e limitado, como é a condição humana, talvez necessitemos de dar alguns saltos de fé para podermos tomar decisões úteis. A fé seria então necessária para uma grande parte dos sistemas de crenças com aplicabilidade prática. Agora veja, o fato de que é preciso por vezes supor como verdade algo que não conseguimos estabelecer como logicamente necessário não significa então que vamos sair acreditando em qualquer coisa, ou que todos os sistemas para escolher crenças sejam equivalentes. Certo, é claro que é possível que todas as nossas percepções sejam falsas, que seja tudo um sonho, uma simulação de computador, um delírio. Do ponto de vista *estritamente* lógico, o fato de que o sol nasceu rigorosamente todos os dias desde que nascemos não torna sequer mais provável que ele vá nascer amanhã. Mas para ter uma vida que faça sentido, e tomar alguma decisão ao invés de ficar atolado num pântano metafísico, você tem que escolher acreditar em alguma coisa – por exemplo que o Sol vai de fato nascer de novo amanhã. Eu aceito este argumento. Mas não decorre daí que “então o sistema de crenças X está certo”, aliás muito pelo contrário – o que se está argumentando é precisamente que nenhum sistema de crenças desse tipo – que exija saltos de fé – é logicamente justificável.
A questão é precisamente como escolher entre sistemas de crenças que, a rigor, não podemos justificar logicamente, pelo menos não de forma necessária. E é aí que entra o princípio científico da navalha de Occam – não vamos sair fazendo suposições a não ser que elas acrescentem poder explicativo ao modelo que estamos construindo para buscar explicar os fatos que estamos admitindo como verdadeiros. Os modelos científicos, porém, são de fato admitidamente provisórios e injustificáveis como logicamente necessários. Isso não significa porém que sejam arbitrários. Tomar decisões lógicas com informações incompletas não garante acertos mas não é equivalente a escolher aleatoriamente. Agora, de um ponto de vista mais prático, a principal justificativa para a ciência é que ela FUNCIONA. Como já dizia Einstein, a coisa mais impressionante, maravilhosa e surpreendente sobre o universo é que é possivel entendê-lo. Enquanto a ciência nos deu reatores nucleares, naves espaciais e computadores, os modelos de como a realidade funciona baseados em teologia e similares não foram capazes de concretamente explicar, prever ou esclarecer absolutamente NADA, em nenhum nível, físico, metafísico, psicológico ou de nenhuma outra ordem. A realidade simplesmente NÃO FUNCIONA do jeito que as investigações teológicas prescrevem, descrevem ou prevêem e isso ao longo da história é repetidamente e facilmente observável. A principal função cumprida pelas crenças religiosas é criar um falso, ilusório e pernicioso conforto diante das questões para as quais se formos honestos não temos resposta satisfatória.
“What men really want is not knowledge but certainty.”
-Bertrand Russell
Agora, novamente, eu admito que do ponto de vista estritamente lógico é perfeitamente possível que, digamos, quem esteja certo mesmo seja a Igreja da Cientologia e Xenu tenha explodido bilhões de pessoas com bombas atômicas. Mas isso para mim é tão realista e verossímil quanto Jesus ressuscitando pessoas ou nossa” alma” voltando encarnada num sapo. Não existe absolutamente qualquer evidência a favor de nenhuma dessas coisas, e entre algo que repetidamente faz previsões extraordinariamente confiáveis, mesmo que essa previsões tenham em parte sido obtidas por tentativa e erro e não por deducão rigorosa, versus um outro sistema de crenças que faz todo tipo de afirmações delirantes sobre a realidade que nunca se observam em lugar algum, eu sinto muito, eu fico com o primeiro. Inclusive diante da impossibilidade de deduzir logicamente como o universo funciona, a grande força da ciência é justamente ter a humildade de admiti-lo e estar disposta a constantemente mudar de idéia quando suas previsões falham – que é muitíssimo mais do que se pode dizer da quase totalidade das crenças religiosas. Então pode ser o caso de que talvez amanhã toda a ciência como atualmente consta dos jornais acadêmicos pare completamente de funcionar, e comece a chover sapos e anjos desçam do céu, mas nesse caso os cientistas serão metodologicamente obrigados a reverem seus conceitos sobre como o universo funciona. Novamente, ao contrário de grande parte dos religiosos, que mesmo diante de montanhas de evidências, aferram-se a crenças imutáveis e inamomíveis usando (quando se dispõem a tanto) de argumentos como esse de que “a fé é um elemento incortornável de qualquer sistema de crenças”. Bolas, mesmo quando é, não significa então que seja igualmente razoável sair acreditando em qualquer coisa.
“The trouble with the world is that the stupid are cocksure and the intelligent are full of doubt.”
-Bertrand Russell
O que nos leva finalmente de volta à minha afirmação original : a fé nao é uma boa base para um sistema de crenças. Se formos chamar de fé qualquer crença que não pudermos estabelecer como verdade logicamente necessária, então de fato em várias circunstâncias teremos que sustentar crenças deste tipo se não quisermos ficar paralisados num atoleiro existencial. Mas isso não significa que a fé seja necessariamente a *base* do meu sistema de crenças, não no sentido de que seja o fator preponderante ou mais significativo. Se alguém for argumentar que é a fé que torna meu sistema de crenças possível, e por isso é sim a base dele, eu observo que não, ela *não* torna meu sistema de crenças logicamente justificável; de fato, nada pode fazê-lo, não no atual estágio em que estamos no entendimento da realidade. A fé é apenas um quebra-galho, um tapa-buracos para o fato de que eu não sei tudo. Mas certas suposições se revelam mais úteis e mais esclarecedoras e com maior poder preditivo do que outras, e eu acho desejável preferir essas suposições às outras. Então, nesse sentido, as suposições são completamente arbitrárias enquanto as conclusões não são, e é pelas conclusões que eu julgo a qualidade das suposições. Os religiosos tendem a inverter isso completamente e insistir em suposições engessadas e imutáveis, tomando portanto a fé como base de seus sistemas de crenças, ao invés de fazerem exatamente o oposto – escolher as suposições não justificáveis que vão fazer com base no quanto as suas conseqüências parecem ser compatíveis com a realidade de fato observada.
Finalmente, o autor “extrai” do mesmo trecho do meu texto as seguinte afirmações :
7) Acreditar em Deus é uma posição circunstancial, não metodológica ou a priori.
8 ) Para a crença em Deus se justificar, é necessária:a) a comprovação empírica de sua existência.b) uma definição que faça sentido e que apresente evidências
9) Tudo o que não possui comprovação empírica é dotado de um aspeco mitológico.
Quanto a (7), isso não é algo “refutável”; eu estou descrevendo a minha posição pessoal.
Quanto a (8), sim, é claro que é preciso haver uma definição que faça sentido. Não dá para debater se deus existe ou não sem que se apresente uma descrição minimamente consistente sobre de quê estamos falando, algo que a maior parte dos religiosos falha completamente em fazer. Note que se formos levar a sério o fato de que o autor afirma ter “refutado” (8), ele quer então que aceitemos a existência de deus sem qualquer evidência empírica (“comprovação empírica” é uma besteira) e também sem uma definição rigorosa seguida de argumentos sólidos. E a rigor, ele está certo – a mera crença em deus não requer qualquer uma dessas coisas, assim como não o requer a crença em gnomos habitando o centro da Terra. A crença em coisas aleatórias requer apenas a vontade de acreditar.
“I wish to propose for the reader’s favourable consideration a doctrine which may, I fear, appear wildly paradoxical and subversive. The doctrine in question is this: that it is undesirable to believe a proposition when there is no ground whatever for supposing it true.”
-Bertrand Russell
Quanto a (9), isso (como inúmeras outras afirmações) não tem absolutamente nada a ver com qualquer coisa que eu tenha dito.
Enfim, eu poderia prosseguir discutindo ponto por ponto o resto do texto, mas ele é completamente desprovido de conteúdo, de mérito, ou mesmo de evidências de ter sido capaz de sequer entender o que eu disse no meu texto original. Está encharcado de confusão mental e de erros de lógica básica, e é uma perda total do meu tempo ficar “refutando” essa extensa besteirada. Inclusive estou cogitando seriamente parar de fazê-lo até mesmo parcialmente no futuro; qualquer ponto que eu poderia querer ilustrar ao dar corda para esse tipo de coisa já foi extensamente exemplificado no passado, e quem não quiser ver continuará mesmo cego. Infelizmente não tenho qualquer dúvida de que isso será interpretado como “oh, se você não está respondendo é porque ficou sem tem o que dizer / não tem resposta / foram apresentados argumentos irrefutáveis”. Longe disso, longe disso. É apenas que esse tipo de texto longe de serem “refutações muito bem estruturadas”, é só um festival de sandices.
Entre outros exemplos que eu poderia citar : eu escrevo que “se a ciência universal fosse atingida, ela nos diria se deus existe ou não” e o sujeito escreve que eu teria dito que “sem a ciência universal, é impossivel afirmar se deus existe ou não”. Eu digo A => B e o sujeito afirma que eu estou dizendo que ~A => ~B, um erro absolutamente básico de lógica que não se admitiria num estudante iniciante. E essa pessoa quer escrever uma refutação nos moldes de um debate escolástico!
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Uma outra resposta um pouco menos primária pode ser encontrada aqui : O empirismo ateísta na corda bamba
Digo um pouco, mas não muito. Em primeiro lugar, o autor parte já de saída do equivocado princípio de que eu só aceitaria argumentos baseados em observacões sensíveis, e não em princípios lógicos ou necessidades metafísicas. Ora, não é que eu não aceite tais argumentos em princípio – apenas eles não existem. E não me venham com São Tomás de Aquino, Santo Anselmo e outras coisas desse tipo porque o que eles nos dão em termos de argumentos ontológicos é simplesmente ridículo e absolutamente não estabelece necessidade lógica alguma de um deus nos moldes cristãos. Existe uma distância brutal entre argumentar pela necessidade de uma “causa primeira” e dizer “então taí, é o deus cristão”. Chamar as verdades que são logicamente necessárias de “deus cristão” não lhes atribui magicamente nenhuma das inúmeras outras características sustentadas pela teologia cristã, nem exime o autor de justificar tais características. Mas ok, pinçando como pinçou o autor uma afirmação completamente fora de contexto, não é supreendente que sua interpretação esteja facilmente sujeita a distorções.
Mas daí ele passa então a fazer outras afirmações mais genéricas que não têm diretamente a ver comigo, como por exemplo de que “Hoje, o grande inimigo do ateísmo é a ciência mais atual.” Er, não, não é, e no caminho para buscar afirmá-lo o autor faz várias afirmações altamente impróprias. Para começar, a ciencia clássica em si mesma absolutamente não é universalmente baseada no “empirismo”. Muito antes de se falar em teoria da relatividade ou em mecânica quântica, a posição filosófica de positivistas e assemelhados, popular que tenha ficado em um dado momento, sempre foi apenas uma facção entre outras e absolutamente não a posição unânime na comunidade científica.
Adicionalmente, o ateísmo absolutamente também não tem como fundamento filosófico essencial nenhuma reverência ao empirismo. Grande parte – diria eu todos os sérios – pensadores ateus aceitariam prontamente argumentos lógicos ou metafísicos a favor da existência de deus caso lhes fosse apresentado um que considerassem válido. Evidentemente diante disso a atitude científica seria verificar que as conseqüências necessárias desses argumentos de fato se observam (e se não fossem observadas seria razoável concluir que existe um equívoco em algum lugar), mas tais argumentos não seriam rejeitados por princípio, só por não serem “evidências empíricas”. Apenas eles não existem. Claro, se apesar de não haver um argumento lógico sólido desde primeiros princípios alguma observação prática revolucionária fosse feita – e aí entra a parte do meu texto que foi citada – então mesmo assim isso seria um motivo forte para rever a posição ateísta. Mas absolutamente não é o caso de que tais observações sejam necessárias como pré-requisito para a idéia ser considerada seriamente.
Além disso, o ateísmo também não está filosoficamente fundado ou associado nenhuma forma à mecânica clássica como quer fazer crer o autor do texto. Para começar, se quisermos construir o argumento de que a ciência avançada caminha no sentido de desvendar um mundo real que está vastamente distante dos sentidos e que absolutamente não é acessível, mesmo com muito boa vontade, diretamente através de observações “empíricas”, eu não só *concordo* com isso, como não é preciso chegar à mecânica quântica para encontrar exemplos. A presença de hélio no sol, a existência de átomos com núcleos e elétrons, a verdadeira natureza das estrelas como objetos concretos brilhantes a grandes distâncias, a evolução das espécies, a gravitação universal, a verdadeira natureza da luz como oscilação de campos elétricos e magnéticos, tudo isso foi atingido pela mecânica clássica e está muito, muito distante do que se pode chamar exatamente de “empírico”. Claro, observações empíricas foram necessárias para se chegar às teorias correspondentes, mas as teorias vastamente superam as observações e falam sobre a estrutura do real de formas que transcendem imensamente o que é diretamente observável. O que possivelmente a mecânica quântica traz de filosoficamente novo é embaralhar significativamente o conceito de nexo causal, mas isso de forma alguma é impeditivo seja para o empirismo seja para o ateísmo.
Enfim, é simplesmente falso que “um dos principais argumentos do ateísmo” seja o empirismo, ou que a transição de ciência clássica para ciência moderna tenha causado (ou sido forçada por) um abandono do empirisimo, ou que a mecânica quântica ou a ciência moderna de modo geral apresente qualquer problema para o ateísmo. Inclusive é muito irônico e até constrangedor que o autor venha acusar os ATEUS de antropocentrismo enquanto a maior parte das religiões é que defende que o ser humano seja filosoficamente, cosmicamente, metafisicamente algo de profunda relevância para o universo, quiçá o propósito mesmo da sua existência.
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Para recompensar os leitores que tiveram a paciência de chegar até aqui, alguns links divertidos :
Still More Things Atheists Didn’t Do
[...] autor deste texto (que será aqui identificado como “autor do texto”) enviou um pingback para este meu postal, o [...]
Aparentemente o autor de um dos textos que eu comentei achou por bem ficar levemente ofendido em ser chamado de “o autor do texto”. Note-se que eu de fato não sei seu nome, que por algum motivo não figura claramente junto a seu texto – consta apenas “O. Braga”. Diante disso passo então a alternativamente chamá-lo de Sr. Braga.
O Sr. Braga afirma – corretamente – que meu texto não é autocontido e toca uma multidão de temas cuja discussão séria demandaria muito mais espaço do que o que usei e adicionalmente uma discussão mais precisa dos termos e premissas dos quais estou partindo. Isso é verdade em especial sobre a parte do texto que precede a resposta ao Sr. Braga. Infelizmente é impossível num post de blog estabelecer todo o arcabouço necessário para discutir seriamente certas questões partindo do zero; ou o leitor já possui um certo nível mínimo de conhecimento do uso convencional dos termos que emprego, ou vai ficar mesmo com uma compreensão incompleta do que pretendi dizer.
O Sr. Braga passa então a fazer algumas afirmações sobre ateus e sobre o que eu teria, em sua interpretação, dito, com variados graus de ficção envolvidos. Algumas observações preliminares :
(1) Eu NÃO disse que a verdade não existe, mas que muda com o tempo; eu disse que a nossa COMPREENSÃO da verdade muda com o tempo, e que não ser capaz de rever sua compreensão da verdade é uma enorme limitação intelectual (na qual a meu ver os religiosos recorrentemente incorrem). A verdade, porém, era única o tempo todo; você é que não foi capaz de apreendê-la.
(1.1) Sim, eu de fato aponto a falta de unidade ideológica entre ateus.
(1.2) “Ao mesmo tempo em que usa e abusa de citações de Bertand Russell”? Isso era para ser um argumento? As citações absolutamente não são nem remotamente para serem tomadas como um recurso à autoridade, e sim como ilustração folclórica das idéias às quais estou me referindo. Não existe em nenhum momento a sugestão de que se deva acreditar nisso “porque” Betrand Russell o disse, e eu explicitamente rejeito tal sugestão.
(2.1) Em NENHUM momento eu sugiro a implicação mencionada. Isso é apenas uma das possibilidades metafísicas à nossa disposição, não uma cadeia de implicações. Temos de fato o problema da causa primeira, mas simplesmente achar que vamos resolver esse problema dando a ela o nome de “deus” é uma acochambração total e não resolve absolutamente nada. O problema da causa primeira não é que nome vamos dar a ela e sim estabelecer a necessidade lógica das propriedades que atribuiremos a ela – um projeto dificílimo e até hoje irrealizado. Mas se vamos simplesmente dizer “ah, a explicação é deus e deus não requer causa anterior” então nesse caso isso é tão satisfatório quanto dizer que as leis das física não requerem causa anterior. Agora, evidentemente nenhum dos dois é realmente satisfatório.
(2.2) Eu absolutamente não coloco a fé como exclusiva dos religiosos, o que eu argumento é que a fé tem um papel diferente na teologia do que tem na ciência, e além disso os métodos utilizados para chegar às crenças específicas também são substancialmente diferentes.
(2.3) Eu de fato coloco essa questão.
Sigamos adiante.
Em primeiro lugar, agrupar “ateus e materialistas” no mesmo saco é impróprio a meu ver. Os dois não são equivalentes ou mesmo suficientemente identificados para justificar tal tratamento. Vou ficar então com ateus. E não, não é nem de longe verdade que os ateus “só conseguem defender seus pontos de vista através da dialética”. Existem todo o tipo de provas e verdades incondicionais que se pode construir com base exclusivamente no pensamento lógico desde primeiros princípios e eu não vejo os ateus coletivamente rejeitando isso. Inclusive eu mesmo argumento isso abertamente no meu texto original. O problema é que diante de conhecimento incompleto, há limites para o tipo de afirmação que podemos fazer que tenha a característica de ser uma “demonstração” ao invés de um argumento dialético. Podemos falar muito, mas além de um certo ponto simplesmente não sabemos o suficiente para afirmar nada categoricamente. Em contraste, os religiosos AFIRMAM argumentar dando “demonstrações” mas estas são completamente furadas, falhas, e não rigorosas. Então não é que um ateu automaticamente não aceite argumentos metafísicos; eu em particular certamente aceito. É só que no estágio de desenvolvimento cognitivo da humanidade ainda não atingimos como espécie sofisticação intelectual suficiente para sermos realmente capazes de construir um argumento metafísico sólido para dar conta da necessidade lógica de algo existir para começar. Agora, diante do fato de que parece bastante claro que coisas existam, ou pelo menos de que esta suposição seja útil, parece útil também supor que tal necessidade lógica exista, mesmo que desconheçamos sua natureza. Mas para fazer ciência sobre, digamos, química orgânica, absolutamente não chegamos no ponto em que possamos fazer “demonstrações” lógicas das leis propostas com base em primeiros princípios metafísicos. Então de fato grande parte do tempo acabamos mesmo é tendo que argumentar sobre pontos e linhas sem jamais provar sua existência. Mas isso é uma necessidade contingente diante do fato de que não sabemos ainda justificar os pontos e linhas; não é uma posição metodologicamente buscada a priori.
O Sr. Braga erege então um monumental boneco de palha ao afirmar que eu teria identificado o ateísmo com a rejeição de uma causa primeira. Eu não só não o faço, como faço explicitamente o contrário. Eu absolutamente não rejeito a necessidade lógica e metafísica de uma “causa primeira”. Minha rejeição é a que haja qualquer argumento ou evidência de que a natureza dessa causa tenha qualquer das propriedades atribuídas a “deus” pela esmagadora totalidade das religiões. Simplesmente chamar essa causa de “deus” é um ato de prestidigitação sofismática. Se alguém vier a provar rigorosamente que as leis físicas que regem o universo eram as únicas logicamente possíveis e que são metafisicamente necessárias, então essa questão estará respondida, e sem recurso a qualquer “deus” como convencionalmente compreendido pelas religiões. A não ser que o Sr. Braga esteja sugerindo interpretações extremamente elásticas e a meu ver forçadíssimas de “deus”, não existe qualquer motivo para supor que ao falar de “causa primeira” eu esteja automaticamente me referindo a “deus”.
Adicionalmente, absolutamente não é o caso de que “ateísmo e determinismo estão sempre de mãos dadas”. Citar Sarte não resolve a questão nem remotamente. Eu em particular certamente não sigo a visão metafísica de Sartre. Este é um outro boneco de palha. Se o Sr. Braga quer colocar essa questão, que explique por que haveria qualquer implicação direta entre ateísmo e determinismo, ao invés de simplesmente citar autores que porventura eram ateus e simultaneamente defenderam determinismo,
Eu concordo com todas as afirmações que se seguem que o Sr. Braga faz sobre a natureza da verdade, porém em se referindo ao meu texto, são fora de propósito, pois nele eu nada afirmo remotamente parecido com “a verdade não existe”, ou mesmo com esta ser uma questão em aberto.
Sobre antropocentrismo, o Sr. Braga resolve realmente apelar. É absolutamente óbvio e ululante o antropocentrismo da quase totalidade das religiões. O homem ocupa nelas de forma explícita um papel metafisicamente especial que é completamente absurdo e injustificável. E não, eu não tenho fobia a definições. Se eu for catar no texto do Sr. Braga a quantidade de termos introduzidos sem qualquer definição ele certamente estará na liderança (inclusive, ironicamente, antropocentrismo no texto original). Apenas é o caso de que não é possível esmiuçar a cada argumento todos os prerequisitos conceituais necessários para compreendê-lo. Quem estiver capacitado a compreender o uso que estamos fazendo dos termos que o faça. Quem não estiver, que faça um esforço intelectual adicional e vá estudar.
Finalmente, é ABSOLUTAMENTE FALSO que a ciência aceite argumentos de autoridade e tradição. No máximo por motivos práticos e pragmáticos se supõe que um determinado autor tenha ele mesmo verificado as afirmações que faz, mas isso é uma posição contingente e sujeita a revisões se surgirem evidências de que ele não o fez. Não é uma posição filosófica ou metafísica, apenas uma necessidade circunstancial. Sobre a questão dos paradigmas, bem, estes de fato são mais complexos de rever, e sua revisão não ocorre por critérios completamente científicos. Mas a posição de um “verdadeiro” cientista – e absolutamente não acho que esteja sozinho ou em minoria ao afirmar isso – é em última análise de prestar reverência somente à verdade, não à autoridade ou à tradição.
Finalmente, sobre o conjunto vazio. Essa é uma noção com a qual estudantes de lógica freqüentemente têm problemas. O conjunto vazio é um sistema axiomático tão bom quanto qualquer outro, e permite o desenvolvimento de uma rica teoria – a das tautologias. E conversamente, a rigor, é tão metafisicamente difícil justificar o nada como qualquer outra condição. A impressão de que haja algo filosoficamente especial com o nada é mais psicológica do que qualquer outra coisa. E certamente não é verdadeiro a nível de lógica que “nada vem do nada”.
Sobre deus ser “auto-evidente”, bem, se estamos falando de deus como causa primeira isso é simplesmente enrolação, dado que “deus” tem universalmente nas religiões uma coleção de características que transcedem enormemente ser simplesmente a “causa primeira”. E se estamos falando de alguma definição mais específica de deus, faltou (malgrado as reclamações do Sr. Braga neste sentido) dizer a qual definição está se referindo.
Senhor, é curioso você fazer um argumentação contra São Tomás, como obsoleto, medievo, mas, ao mesmo tempo, usar do argumento de William of Ockham, também medieval. Ou seja, a sua estrutura de argumentação é baseada num preconceito, e numa irrazoabilidade que saltam aos olhos.
Sua tréplica ao artigo apresentado falhou miseravelmente, seja por falta de conteúdo, seja por falta de organicidade (como ficou apresentado acima).
Seria bastante conveniente meditar sobre o que você está dizendo, e parar com argumentos baseados em tempo, pois é falso que algo se torne pior porque é velho. Tem a coragem de falar que Platão ou Aristóteles é inútil hoje em dia? Por que nosso amigo São Tomás pegou uma obra de mais de 12 séculos e a usou, criticamente?
Inútil e vazia sua argumentação, como a maior parte dos ateus.
E se você acha que São Tomás está morto, acaso teve a honestidade de procurar sobre os neotomistas, inclusive Bernard Lonergan, por exemplo, que tem uma epistemologia genial, baseada em São Tomás, sem desconsiderar certos pontos da Filosofia moderna? O cerne é São Tomás. E por causa dessa argumentação, o talvez mais importante filósofo do século XX entrou em ostracismo.
Eu nunca pretendi afirmar que algo é automaticamente obsoleto apenas por ser antigo. Os gregos já sabiam que a Terra era redonda e não plana e que raiz de dois não é uma fração e nem por isso agora somos forçados a rejeitar tais conclusões. Inúmeros outros exemplos abundam. Minha crítica é a quanto a se aceitar um argumento não porque sua estrutura e validade tenham resistido à passagem do tempo e sim devido ao prestígio ou autoridade, mesmo que plenamente merecidos, de seu autor – um cacoete que eu percebo como particularmente comum entre os religiosos.
Agora veja, quem está primando pela incoerência em sua crítica é você. Se eu fosse movido pelo preconceito, e não pela consideração do conteúdo, jamais teria citado um princípio como o de Guilherme de Ockham. Então o próprio exemplo que você cita é evidência do quanto não estou escolhendo minhas citações com base em quando ou quem escreveu e sim com base na minha percepção da solidez das idéias a que faço referência.
Novamente, eu NÃO afirmei em nenhum momento que algo se torne falso ou pior só porque seja “velho”. Essa é uma posição que eu concordo que seria ridícula, e de fato infelizmente adotada por alguns modernosos pseudo-progressistas que acham que tudo que vale a pena saber foi descoberto depois que nasceram. Eu NÃO sou adepto dessa visão. Mas por outro lado, também NÃO sou adepto da visão de que os grande sábios do passado eram infalíveis e que devamos a eles delegar o nosso julgamento crítico. Por vezes acertaram, por vezes foram superados. É apenas nesse aspecto que eu concordo sim com os progressistas : é preciso, é essencial conhecer o que se pensou em tempos modernos para se poder avaliar o quanto o pensamento do passado se tornou obsoleto. Em vastas áreas se tornou; em vastas outras não.
O pensamento de Aristóteles sobre *certas* áreas como física e lógica formal está sim de fato completamente obsoleto hoje em dia. Muitas das coisas que ele escreveu inclusive se demonstraram posteriormente rigorosamente ERRADAS. Isso significa que ele era um idiota? Não, ele foi um gigantesco gênio que viu muito adiante de seu tempo. Mas depois dele vieram muitos outros que levaram ainda mais longe a busca da verdade. Transformá-lo em objeto de culto é trair tudo o que ele estava buscando atingir.
São Tomás de Aquino também foi um importantíssimo pensador, mas grande parte de seus argumentos também não carregam hoje a mesma força que na época em que foram concebidos. E um dos motivos para ele se referir a Aristóteles foi a terrível decadência intelectual que assolou a Europa após a queda do Império Romano, associada ao culto acrítico à obra Aristotélica promovido e dominante à época.
Enfim, note que você não apresentou nenhum argumento direto contra nada do que eu tenha dito; apenas parou em afirmações de que “é baseada (…) numa irrazoabilidade que salta aos olhos”, “falhou miseravelmente”, “falta conteúdo”, “falta organicidade”, “inútil e vazia”, etc, sem de fato substanciar tais afirmações com críticas mais concretas a colocações específicas que eu tenha de fato feito. A única coisa um pouco mais concreta que se colocou foi criticar a idéia de o que é velho seria automaticamente obsoleto, que eu nem sequer defendi, para então dar como exemplo do meu “preconceito”… eu ter citado uma fonte medieval? Isso sim é que é ser incoerente.
Novamente você segue o pecado dos escolásticos decadentes como de outros ao confundir os exemplos das aplicações metafísicas Aristotélicas com o pensamento em si.
Ora meu amigo, você disse lá em todas as letras que seguir um método organizado, de origem medieval, é ridículo. Ridículo implica uma valoração muito forte. Citando: “Argumentar no século 21 com base nas categorias metafísicas e na estrutura lógica que prevaleciam na escolástica medieval é RIDÍCULO”. Apontei a contradição, pois o que se trata aqui é da Idade, a época mais desconhecida da História entre as pessoas, e não do pensamento em si.
Culto acrítico da época de Aristóteles é meio duvidoso. Aristóteles fez uma sistematização de toda a filosofia da época até então, procurando soluções aos problemas que Platão não havia até então resolvido. Esse culto acrítico se dava exatamente porque o acesso a essas obras era só possível a quem possuía dinheiro, sendo que só pôde ser livremente discutido nas Universidade livres da Idade Média. São Tomás não é acrítico perante Aristóteles, e sabe-se muito bem disso.
Quanto à lógica formal, isso é curioso, pois mesmo se considerando erradas por muitos, até mesmo seus pressupostos filosóficos, é usada desde dos idealistas aos pressuposicionalistas (um tipo de filosofia reformada).
De qualquer forma, apontei a incoerência lá, pois enfatizou-se o século XXI, de modo que se apontou claramente um quê evolucionista, ou positivista, em seu pensamento.
Salve!
É realmente muito cansativo argumentar com quem nem sequer consegue ler o que está escrito. O que eu escrevi foi algo razoavelmente específico : que é ridículo argumentar com base nas categorias metafísicas e na estrutura lógica que prevaleciam na escolástica medieval, não que qualquer coisa que qualquer um tenha escrito sobre qualquer assunto na Idade Média esteja automaticamente errado ou seja ridículo. Então não, eu NÃO disse que “seguir um método organizado de origem medieval seja ridículo”. Eu disse que seguir UM certo método medieval específico hoje é ridículo. Mas aparentemente essa distinção “sutil” está além do que é possível fazer compreender aqui, mesmo quando afirmada explicitamente.
De fato, só fica mais e mais claro a cada dia quão oportuno foi o meu texto “Citando Aristóteles“.
Deus não existe e parem de brigar, crianças.
Certo, é tão absolutamente óbvio que deus não existe que não faz sentido algum perder tempo discutindo por causa disso, certo?
Não, errado. Ingenuamente, alienadamente, perigosamente errado.
Religião absolutamente não é apenas algo delirante, mas inofensivo. Não tenha ilusões do que aconteceria se por exemplo os nazichatólicos tivessem poder político suficiente para imporem sua vontade. Aliás, nem sequer é preciso imaginar – basta observar o que aconteceu todas as vezes em que tiveram. Não tenha ilusões também do quanto diversas religiões, não apenas a seita nazichatólica, luta diariamente para conquistar a maior quantidade possível de poder político com a explícita intenção de então impor seus preconceitos, er, dogmas de fé, er, verdades absolutas reveladas e infalíveis, a toda a sociedade. Finalmente, não tenha ilusões sobre o quanto de fato CONSEGUIRAM e estão conseguindo fazê-lo em vastas partes do mundo HOJE com conseqüências terríveis, e do quando NÃO existe um progresso inevitável no mundo em direção ao abandono da religião.
O mundo está passando por um lamentável ressurgimento de fundamentalismo religioso e as conseqüências não são nem um pouco infantis. E as pessoas são ganhas ou perdidas para a causa da liberdade e da autodeterminação individualmente, uma a uma, algo que os religiosos percebem muito bem. Eu não tenho qualquer esperança de “desconverter” as pessoas que vêm aqui dizer que a existência de deus seria auto-evidente (!) mas eu tenho alguma esperança de conseguir suscitar, em quem vê esse tipo de debate, um questionamento crítico das besteiradas religiosas que lhes são enfiadas goela abaixo noite e dia sem muitas vozes se levantando em oposição.
Combater religião ativamente é mais do que prudente e sábio, é um dever moral.
Saudações,
Sergio
No meio de tanta bobagem dita contra o seu texto, registro aqui meus cumprimentos à sua coerência lógica e à sua maturidade com os termos de que dispomos pra construir o nosso conhecimento. Qualquer dia faça um post com uma bibliografia sobre filosofia da ciência, esse é um assunto fascinante.
Abraços,
Leonardo
Bem, você me colocou a pensar sobre o assunto e aí acabei escrevendo isso aqui abaixo :-)
../.././30/breve-bibliografia-em-filosofia-da-ciencia/
Saudações,
Sergio
[...] Enfim, a resposta em questão se refere ao meu texto Ateísmo Para Principiantes. [...]
Resposta às minhas observações para quem quiser ler mais no mesmo estilo por mim criticado na primeira parte do presente texto.
http://www.xr.pro.br/VISITANTES/VISITANTES761.HTML
Sergio,
saúde.
Confesso gostar dos seus textos; são claros, limpos e com algum humor.
Não compreendi isto: “Combater religião ativamente é mais do que prudente e sábio, é um dever moral.”
Li e entendi que você está atento a um tipo especial de renascimento do fundamentalismo religioso – o especial fica por minha conta – e, portanto, combate nos termos mais honestos possíveis.
Sérgio, você toma imprescindível combater toda manifestação religiosa?
Com respeito,
M. V. M. de Arruda.
Bem, depende do que você chama de “manifestação religiosa”. O que eu acho imprescindível, essencial, importantíssimo combater são as instituições religiosas nos moldes em que usualmente se organizam. E para mim o problema fundamental não é que religião seja irracional (embora obviamente seja), e sim que ela quase universalmente incentiva e exige que os seus seguidores abram mão de seu julgamento pessoal sobre o que é certo e errado, sobre o que é verdadeiro e falso, e o depositem e deleguem a alguma autoridade externa. Isso leva a todo tipo de distorções, intolerência, opressão e a uma quantidade inenarrável de destruição e sofrimento ao longo da história.
Agora, é preciso qualificar também esse “combater”. Quando digo isso, não é sair por aí queimando templos ou proibindo nada, especialmente não proibir as pessoas de manifestarem civilizadamente suas crenças. Eu continuo achando que cada um tem o direito – e deve ter assegurada a liberdade – de acreditar no que quiser. Quando digo combater, é com convencimento, com idéias, com educação e com argumentos.
Mas sendo essas ressalvas colocadas, acho sim que religião deve ser combatida ativamente e que isso é muito importante. Estruturas sociais organizadas seriamente em torno de religião tornam-se com regularidade previsível intoleravelmente totalitárias. Grupos religiosos quase universalmente não apresentam qualquer hesitação em tornar seus mais bizarros preconceitos em lei em obtendo suficiente poder político. Então eu acho que religião deve ser combatida de forma similar a que acho que comunismo deve ser combatido : é um aglomerado de idéias perversas, destrutivas e delirantes, pretensamente justificáveis moralmente em nome da fraternidade e do bem comum, mas que na prática e historicamente produzem totalitarismo, destruição, sofrimento e opressão. Mas apesar disso, deve ter pleno direito de existir, de divulgar suas idéias, de concorrer a presidente, etc.
Saudações,
Sergio
Sérgio Di Biasi, falem o que falarem, mas um mérito você tem: é um homem paciente, e este post o prova. A tréplica já está lá no site refutatio. Será que teremos mais uma resposta?
Bom, na verdade não quero discutir precisamente a existência de Deus, mas só discordar da sua opinião de que os argumentos do tipo “causa primeira” nada tem a ver com o Deus das religiões. Vejamos só: só pelo argumento da causa primeira, já se chega a um ser que:
- É a causa de todos os outros
- Sem o qual nenhum outro ser existe ou poderia existir
- Não depende de nenhum outro ser para sua própria existência, e nem nunca poderia deixar de existir.
- É imaterial
Dou uma rápida trabalhada no argumento da causa primeira aqui (no caso de suscitar seu interesse): – “Quem Causa a Causa Primeira?” http://tavista.blogspot.com/2010/07/quem-causa-causa-primeira.html
Enfim, tanto filósofos quanto crentes aceitariam as caracterizações acima. O grande passo para, digamos, estabelecer a identificação dos dois conceitos seria provar que a Causa Primeira tem que ser inteligente ou algo que o valha; não é uma mera entidade bruta, mas, digamos, uma Razão, um Intelecto. Mas mesmo sem dar esse passo, é possível dizer que não há nada inconciliável entre a Causa Primeira e o Deus das religiões monoteístas. Um católico não veria problema em chamar a Deus de Causa Primeira; ele provavelmente só diria “ok, mas existem mais coisas que podem ser ditas sobre Deus do que diz o argumento da causa primeira”, e aí entram sim questões de Fé, que é incompatível com demonstrações, mas não com evidências, e portanto não necessariamente irracional; apenas não racionalmente demonstrável.
Oi Joel,
Não, eu não pretendo dar uma resposta à resposta à minha resposta… a reposta original já é ruim que chegue. Sabe, uma coisa é ter uma opinião da qual eu discordo, outra é estar falando nonsense total, e ainda por cima desonesto (isto é, representando minhas opiniões de uma forma tão distorcida que não posso conceber que seja um erro sincero).
Sobre a causa primeira, olha só, não é que ela não tenha *nada* a ver com o deus das religiões; a questão é que dos argumentos apresentados sobre a necessidade de uma causa primeira num contexto teológico, quase universalmente salta-se então para todo tipo de conclusões sobre propriedades adicionais da causa primeira que não são nem remotamente logicamente necessárias. Por que teria que ser um único deus, e não vários, ou mesmo infinitos? Por que tem que ser um ser com autoconsciência ao invés de simplesmente uma força impessoal da natureza? E como é que ética e moral têm qualquer coisa a ver com isso? Etc, etc.
Então é nesse sentido que eu repudio as tentativas de justificar deuses através de argumentos sobre “causas primeiras”. Mesmo que aceitemos que uma “causa primeira” seja necessária – e até isso é discutível – daí não decorrem todas as propriedades fantásticas atribuídas aos deuses das religiões. Então se formos entender o conceito de deus como apenas um *nome* para a causa primeira ao invés de como uma figura mitológica que ocorre de cumprir o papel de causa primeira nas religiões, então realmente ele tem muito pouco a ver com os deuses como apresentados pelas religiões do mundo.
Saudações,
Sergio
Prezado,
Você concorda com o Dr. Hawking quando diz em seu novo livro que a Lei da Gravidade, ou outra lei do universo, poderia ter trazido o universo do nada?
Eu concordo, acho que é por aí mesmo, mas por outro lado de onde teria vindo a lei da gravidade?
Para mim a única resposta que faz sentido no final das contas é que o universo seria logicamente necessário, a priori, e por isso surgiu. O processo de como surgiu parece mesmo que em algum momento vai dar em matéria e energia surgindo do “nada” mas este “nada” já continha as leis físicas e regras que exigiam (ou pelo menos permitiam) o surgimento de certas coisas e não outras. Então embora vazio de matéria e energia, não era metafisicamente vazio. A questão é conseguir encontrar essa última ponte entre realidade física e necessidade lógica. Isso seria de longe um dos maiores triunfos possíveis da compreensão humana. Não está claro que um dia conseguiremos. :-)
Saudações,
Sergio
Entendo que outra lógica que se impõe é que esse “não-vazio” metafísico, que existia no lugar do nada absoluto, teria de conter em si todas as potencialidades para determinar tudo que efetivamente existe. Do que não é não pode surgir o que é. Ou pode?
Nós somos a materialização (desculpe, não consegui evitar o trocadilho) da capacidade da matéria de tomar consciência de si própria; de explicar muito de como funciona a parte de nós mesmos e do resto do universo que não tem essa consciência, e até mesmo ter a incrível capacidade de duvidar se poderemos um dia encontrar aquela ponte entre a matéria e sua própria lógica.
Posso concluir que aquele “não-vazio” era mais inteligente e consciente de si que nós mesmos?
Chegamos em Deus?
Fico muito feliz de ter minhas questões analisadas e respondidas por alguém cujas idéias e formas de apresenta-las admiro muito.
Oi Almeida,
Se formos considerar que o “não-vazio” pré-universo possa ser considerado inteligente ou consciente em algo mais do que potencialidade, então este “não-vazio” automaticamente requererá ele mesmo uma explicação. Como teria surgido esse “não-vazio”? É a mesma questão que com a lei da gravidade. Mesmo que ela seja suficiente para explicar o surgimento de todo o resto, continua requerendo ela mesma uma explicação.
Agora, sobre o “não vazio” ser “mais inteligente” ou “mais consciente” do que nós, um dos maiores triunfos da ciência foi precisamente descobrir que isso não é necessariamente verdade. Que existem muitos sistemas nos quais a partir de leis simples e peças intercambiáveis emerge espontaneamente complexidade num nível superior de abstração, sem necessidade de um plano ou de um guia. Inclusive uma compreensão mais moderna do assunto é que isso é não apenas possível como cosmicamente provável – estatisticamente, os sistemas que mais rapidamente aumentam a entropia tendem a prevalecer, e ironicamente sistemas complexos (i.e. de baixa entropia) tendem a ser mais eficientes em aumentar a entropia total do sistema.
Mas de fato, seja qual for a natureza do “não vazio” pré-universo, a questão mais fundamental é precisamente essa : de onde veio esse “não vazio”? Do vazio total (inclusive de leis) pode surgir alguma coisa? E eu diria que entender como responder a essa pergunta é o maior desafio de todos.
Eu pessoalmente não vejo problemas *lógicos* com algo surgindo do nada, aliás pelo contrário; o nada total é justamente a ausência de leis de qualquer tipo. Alguns resolvem neste ponto querer citar “Ex nihilo nihil fit” como se fosse uma revelação divina, mas isso é um argumento impreciso e falho pelos padrões modernos. Em termos de lógica pura, é perfeitamente possivel sim tirar todo tipo de conseqüências do nada, apenas elas terão que ser todas tautológicas (isto é, logicamente equivalentes ao nada). Então me parece perfeitamente possível um projeto de pesquisa que busque justificar o surgimento do universo a partir do nada completo como sendo logicamente necessário (ou pelo menos permitido) e ao mesmo tempo compatível com a equivalência com o nada ser mantida. Claro, esse é um problema dificílimo, que pode ser sintetizado na necessidade de justificar o que percebemos como quebras de simetria. Mas por outro lado existem já proto-propostas sobre como resolver isso; uma delas é supor que todos os universos logicamente possíveis estão continuamente sendo criados a todo instante e estamos em apenas um deles. Não é uma resposta lá muito satisfatória, mas é logicamente consistente.
Saudações,
Sergio
Este assunto sempre me interessou, mas o grande problema era que a grande maioria dos ateus simplesmente iam contra o Deus apresentado pela religião e não contra o Deus quanto “inteligência Universal”.
Todos argumentos contras e a favor são possíveis de serem rebatidos até mesmo pela simples negação. O grande argumento que tinhamos era o argumento do raciocínio lógico de que toda criação intelingente sugere um criador inteligente, e nada é mais inteligente que as leis naturais. Mas este argumento não prospera há muito tempo.
Diante disso tudo, concluo com certeza absoluta que crer ou não em Deus, é uma questão de escolha, é uma opção. Digo isto porque não há como provar, pelo menos por enquanto, sua existencia ou não.
Eu pessoalmente tenho algumas experiências que me fazem acreditar na inteligência fora da matéria, em Deus e na existência pós morte. Mas enfim, o mesmo raciocínio que me leva a crer nisto tudo, as vezes me leva a me questionar se não tenho um certo teor de esquisofrenia.
O chato é que a resposta só virá se eu estiver certo, pois se estiver errado eu retornarei à terra, virarei esterco e servirei de alimento a outros serem orgânicos.
O argumento de que “se não é possivel provar algo definitivamente então acreditar ou não é igualmente racional” não é bom. Eu proponho que há neste momento uma nota de dez reais enterrada em algum lugar em Marte. Se eu perguntar se você acredita nisso provavelmente dirá que não. Eu certamente direi que não. Mas nenhum de nós pode *provar* que não haja. Diante disso é apenas uma “escolha” acreditar que não haja? Absolutamente não. Nós lidamos na vida real o tempo todo com situações para as quais não há prova absoluta de nada, aliás a maior parte das situações reais é assim. Então de repente é “apenas uma opção” acreditar que se você não colocar gasolina no tanque o seu carro vai parar de andar? Claro, pode ser que alguém tenha resolvido encher seu tanque durante a noite toda vez que você vai dormir. É logicamente possivel. Só não é muito provável. Em termos do que é real é abundantemente mais razoável é acreditar que não.
Saudações,
Sergio
Sua colocação é perfeita, você tem razão, dentro do que é real, realmente é mais razoável acreditar que não.
Nós humanos tendemos a ver aquilo que gostaríamos de ver, interpretamos cada quadro de acordo com a quantidade de conhecimento pessoal acumulada e de experiências pessoais vividas.Tais como as oficinas de texto, é impressionante a quantidade de interpretações que se extrai de um mesmo texto por pessoas diferentes, que tiverem educação e vivencias diversificadas..
Não cabe em qualquer cerébro por mais inteligente que seja, entender uma coisa que não tenha começo ou fim. Definitivamente o “nada” não cria alguma coisa. Como você colocou em uma resposta mais acima, se leis criaram o universo, elas teriam que existir antes, se existiam, eram alguma coisa e é esta coisa que chamamos de Deus, somente divergimos dos ateus se esta coisa era inteligente ou não.
Talvez não seja uma opção pura e seca, mas uma opção do que nos alimenta o espirito. O Amor, o carinho, a carencia a consciência seriam somente instintos de sobrevivência e reações quimicas que surgiram por acaso?
Talvez eu queira tanto que Ele exista, talvez eu precise tanto dele para ultrapassar as barreiras surgem em minha vida, talvez eu queira tanto acreditar que alguem mais poderoso que tudo vai me ajudar a superar meus problemas, minhas dores, angustias e necessidades, que meu cerébro criado por acaso, mas com um poder inigualável, me faz acreditar piamente que ele está a meu lado.
Saudações e parabens pelo seus textos!! Você é muito bom no que faz e escreve muito bem. Espero que eu esteja certo e que um cérebro tão privilegiado não desapareça simplesmente com a morte. Mas se eu estiver errado, sei que vai deixar muitas heranças intelectuais.