A Tristeza Do Homem Sublime

December 22nd, 2009 by Sergio de Biasi


A Tristeza Do Homem Sublime

Alguns dias depois de eu publicar este texto aqui, eis que vejo um post do Pedro intitulado Duas canções para o “homem médio”, segundo ele “exercícios métricos para desanuviar” o clima de “Bolsa-Amor do Ministério da Saúde” produzido pelo meu texto. Por um lado eu acho absolutamente justo que o “homem médio” se sinta frustrado com um sistema no qual  a felicidade seja tão elusiva. Por outro, eu concordo com o Pedro que liberdade para buscar algo não é o mesmo que o estado ou a sociedade garantirem que você vai encontrar. E concordo adicionalmente que se ficamos chateados com as complexidades do comportamento dos outros, devemos antes de lhes atribuirmos toda a responsabilidade por nossas atribulações estarmos preparados para perceber o quão complexas são as nossas próprias necessidades. E precisamos estar, como em tudo o mais, dispostos a fazermos coisas que não queremos fazer para podermos obter resultados que de fato queremos. Isso se chama investimento, e ter autocontrole suficiente para fazê-lo, e para fazê-lo sem ficar fazendo cara feia e beiço é provavelmente umas das marcas mais distintivas de maturidade e equilíbrio emocional.


A Tristeza Do Homem Sublime
(versão alternativa)

Comento adicionalmente que ao tal “homem sublime” que se supõe “oprimido pela massa ignara” apenas como forma de responsabilizar a todos menos a si mesmos pelos seus problemas se opõe o “homem admitidamente pecador” que se supõe oprimido por sua insuperável e incontornável natureza torpe apenas como forma… de se eximir da responsabilidade pelas próprias escolhas. O fato de que não somos e não podemos ser perfeitos não é argumento para não buscarmos ser o melhor que pudermos, nem para eximir todo mundo de qualquer responsabilidade de pelo menos tentar ser bom. Dizer “é, eu sou mau mesmo, todos somos, quem disser que não é um impostor” é uma forma muito conveniente de se justificar por não buscar superar a própria ruindade. E se por um lado nem sempre tudo é “culpa do sistema”, por outro lado existem sim, situações nas quais o sistema é opressivo. Agora, mesmo quando isso é verdade, não precisa ser culpa de ninguém, e talvez seja em parte nossa. E mesmo quando baseada em insatisfações legítimas, de fato ficar paralisado nessa visão negativa do mundo no estilo “socorro, estou sendo oprimido” não nos leva muito longe. Então a alternativa a ficar só reclamando é tomar armas contra um mar de problemas, e em opondo-se a eles, sonhar derrotá-los. E não degenerar em ficar choramingando e com isso deixar de fazer o que pode de fato ser feito sobre o assunto. Quanto a isso tenho que concordar. E não me parece que meu texto sugira algo diferente disso. Muito pelo contrário. Mas se para certos paladares falta uma medida extra de desanuviação, sirvamos um pouco on the side.


Now we see the violence inherent in the system!


9 Responses to “A Tristeza Do Homem Sublime”

  1. Claudio says:

    Putz, falhei miseravelmente em ver qualquer proposta de “Bolsa-Amor do Ministério da Saúde” no texto. Como o Pedro te conhece, talvez ele tenha visto algo nas entrelinhas, you pervert!

    Eu, por outro lado, tive que me ater ao que estava escrito :-).

    • Oi Claudio,

      O Pedro, sujeito criativo que é, aparentemente não se sentiu preso pelas amarras do texto literal. :-)

      Mas falando um pouco mais sério, uma parte da questão “enuviante” ao olhos dele me parece a de terem sido colocadas as relações entre homens e mulheres num contexto tão, digamos, antropológico. Mas bolas, somos um bando de macacos vestidos mais do que gostaríamos de admitir. Negá-lo não nos trará mais insight ou transcendência, aliás tendo a achar que pelo contrário.

      Outra questão levantada, tanto quanto eu consiga perceber, é dizer que olhar para tudo isso e se colocar como ao lado e à parte de todo esse fenômeno é forçar a barra. Mas aí não me parece que eu tenha feito isso. Se por um lado de fato não me considero “homem médio”, por outro tenho que lidar essas questões, inclusive vindas de mim mesmo, como todo mundo.

      Finalmente, me parece que uma outra questão de alguma forma colocada foi quanto à legitimidade de alguém que enfrenta as dificuldades inerentes à condição humana se colocar como “vítima”. Mas novamente, não me parece que tenha sido esse o tom do texto. A situação que descrevo, frustrante que seja, não nos torna todos uns bando de vítimas, nem eu em particular me sinto ou me coloco como tal. O que não significa que eu goste de que a situação seja frustrante como eu a descrevo; mas nem toda situação frustrante nos torna vítimas. E mesmo quando legitimamente somos (que não é o caso), podemos ficar sentados choramingando ou podemos fazer algo sobre o assunto.

      Enfim, como eu disse quando você comentou que alguns iriam possivelmente interpretar o texto original como uma choramingação : depende do leitor. :-)

      Saudações,
      Sergio

      • Claudio says:

        A interpretação era inevitável. É como o cara que reclama da corrupção e alguém diz que ele só reclama porque não está se dando bem. Não posso dizer se vocÊ escreveu como vítima ou como um favorecido pelo “sistema.” Aliás, discutir intenções por trás do que está escrito é muito freudiano pra mim. Note que não é nada diferente do que fazem contra os liberais: “você defende a diminuição de impostos porque não se importa com os pobres que são atendidos pelos programas governamentais.” É uma falácia argumentativa manjada. Mas muito eficiente.

        • Oi Claudio,

          A interpretação do tipo “ah, se o sujeito está reclamando deve ser porque não está dentro do esquema” era uma das possíveis, claro. Mas eu acho que a crítica do Pedro foi mais na direção de “bolas, que autoridade moral tem um sujeito para julgar os outros?”. Crítica que eu completamente rejeito, mas que de fato vai, como você disse, na direção de questionar as motivações sem sequer se referir ao conteúdo.

          Saudações,
          Sergio

  2. Filipe says:

    Ótimas versões! ;-)

  3. André says:

    Bela performance.

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